quarta-feira, 27 de novembro de 2013

I Carta de João

De um ponto de vista estritamente literário, a Primeira Epístola de João (I Jo) poderia ser classificada como um sermão ou um discurso teológico. A razão é que não se encontra na carta qualquer menção de autor, destinatário, introdução, saudações e despedida. No entanto, desde os primeiros tempos do Cristianismo se tem reconhecido que este documento é, se não uma missiva pessoal propriamente dita, uma espécie de carta pastoral dirigida ao conjunto dos membros de algumas igrejas residentes em lugares próximos uns dos outros: pequenas congregações da Ásia Menor, necessitadas de instrução e conselhos que as ajudassem a viver em plenitude o testemunho da sua fé em Jesus Cristo que “veio em carne” (4.2-3).

DATA E LUGAR DE REDAÇÃO
Sendo assim, a falta desses dados pessoais que são característicos do gênero epistolar, o presente escrito tem sido atribuído, desde o princípio, assim como também 2 e 3 João, ao apóstolo João. Tradicionalmente, se admite que foi escrita em Éfeso, por volta dos anos 90.
Mesmo que se entenda como sermão ou como carta, o certo é que I João está muito próximo do Evangelho Segundo João, tanto por razões de redação como pela ternura com que também ela chega ao leitor, por essa entonação cálida tão claramente perceptível em expressões como “filhinhos” ou “filhinhos meus” (2.1,12,14,18,28; cf. Jo 13.33; 21.5) e nas freqüentes notas como “vos escrevo” (2.7-26; 5.13).


PROPÓSITO
O estilo literário de I João é repetitivo. Os diversos temas, logo após uma exposição inicial (1.5—2.29), reaparecem pela segunda (3.1—4.6) e ainda pela terceira vez (4.7—5.12), mesmo separadamente ou entrelaçados. Essa insistência nos elementos temáticos vem lançar luz sobre algo que pertence aos próprios motivos básicos do escrito, que não são outros senão a inquietude do autor ante a presença de certos elementos estranhos que, em diferentes lugares, estavam perturbando a fé e a comunhão dos crentes.
O autor não diz quais eram as doutrinas e nem quem eram os causadores da sua preocupação, mas, provavelmente, tratasse de alguns ensinamentos que, sob o nome genérico de “gnosticismo”, começavam desde então a infiltrar-se nos círculos cristãos da Ásia Menor.
Assim como no quarto Evangelho, também 1João manifesta o propósito perseguido pelo seu autor. A epístola inteira é um testemunho “com respeito ao Verbo da vida” (1.1; cf. Jo 1.1), uma confissão de fé escrita “para que a nossa alegria seja completa” (1.4), “a fim de saberdes que tendes a vida eterna, a vós outros que credes em o nome do Filho de Deus” (5.13. Cf. Jo 20.31).


CONTEÚDO E ESTRUTURA
Expressões como estas dão característica à carta, que afirma a divindade de Jesus Cristo (1.2-7; 2.22-23; 4.2,8,14; etc.), expressa a filiação divina do crente (3.1-2,9-10; etc.), reprova a conduta dos “anticristos” (2.18-19,22; 4.3) e revela que a justiça de Deus se cumpre no fato essencial do seu amor, demostrado ao entregar o seu Filho em “propiciação pelos nossos pecados” (2.1-2; 3.5; 4.8-10,16-17).
Contra os “anticristos”, esses falsos profetas que negam a divindade de Jesus e a sua missão redentora, João exorta os cristãos a que permaneçam no relacionamento de amor e vida, que é a comunhão com Deus, concretizada na realidade imediata do amor fraternal (2.9-11; 3.9-12,14-18,23; 4.7-8,11-12,16-21).
O vocabulário e as locuções desta epístola evocam ao leitor a linguagem do quarto Evangelho: ser chamados de filhos de Deus (3.1-2,10), ser nascidos de Deus (3.9), permanecer em Deus (2.24,27-28; 3.24; 4.7,16; etc.), ter o Pai (ou ter o Filho) é possuir a vida eterna (2.23; 5.12-13).
A carta e o Evangelho também se aproximam no uso de determinados conceitos e imagens, apresentados muitas vezes em forma de antítese: luz-trevas (1.5-7; 2.8-11, cf. Jo 1.5; 8.12; etc.), verdade-mentira (1.6,8; 2.21, cf. Jo 8.44), vida-morte (3.14; 5.12, cf. Jo 5.24-25), filhos de Deus-filhos do diabo (3.10, cf. Jo 8.44). Igualmente é característico da epístola e do Evangelho o uso da palavra “Verbo” para referir-se ao Filho de Deus feito homem (1.1, cf. Jo 1.1-5,14).
Com essas e outras figuras literárias, o autor explica em que consiste o conhecimento que o cristão tem de Deus: Deus é amor, e amar é conhecer a Deus (4.7-12,16,21) com um conhecimento que tem sido revelado em “Jesus Cristo. Este é o verdadeiro Deus e a vida eterna” (5.20).



ESBOÇO:
Prólogo: O Verbo da vida (1.1-4)
1. Deus é Luz: Permaneçamos na luz (1.5—2.29)
2. Deus é o nosso Pai: Andemos como filhos de Deus (3.1—4.6)
3. Deus é amor: Amemo-nos uns aos outros (4.7—5.12)
Epílogo (5.13-21)

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